Thursday, March 30, 2006
PRECE
Senhora
das feras
e esferas
Senhora
do sangue
e do abismo
Senhora
do grito
e da angústia
Senhora
noturna
e eterna
— escuta-nos!
De Teia (1996)
MÉDIA
Meia luz.
Meia palavra.
Meia vida.
Não basta?
De Transposição (1969)
Orides Fontela
das feras
e esferas
Senhora
do sangue
e do abismo
Senhora
do grito
e da angústia
Senhora
noturna
e eterna
— escuta-nos!
De Teia (1996)
MÉDIA
Meia luz.
Meia palavra.
Meia vida.
Não basta?
De Transposição (1969)
Orides Fontela
Monday, March 27, 2006
O TEU CORPO
É sagrado o teu corpo
abençoadas são as tuas mãos!
E os teus dedos que se recortam
e destinguem uns dos outros, preciosos.
É divino o teu rosto de rainha, sereno como uma deusa!
São luminosos os teus olhos, quando me olham
e perpassam o coração...
É redentor o teu colo
onde se refugia o homem e a criança,
quando choram, riem e sofrem
Mulher!
R.Leonor Pedro
«je sors de toi
mais indéfiniment retenue dans ton ventre»
LUCE IRGARAY
Minha Mãe meu Amor
1
Lembro-me do paraíso
No teu interior
O paraiso:
Com árvores
e oceanos
Penumbras incessantes
num enredado princípio
E havia também a maça
Do teu útero
Sítio: da tentação do início
***** ***
8
Este cordão umbilical
Que nos liga
Do chão do teu corpo
Ao chão da minha boca
A respirar-te
Devagar
O coração
**** ***
9
Deito-me junto do sal
Das tuas raízes
Na água salgada
Dos teus olhos
A ouvir respirar
o teu corpo
**** ****
6
A tapeçaria da tua
voz
feita com animais de asas
Com casas
Com aves
Bordadas
**** ****
1
Falei-te
De um passado
Cheio de ondinas
De sereias e de aves
Com uma mãe por detrás
A comandar as fadas
Tersa Horta
in Minha Mãe meu Amor
*** ****
«que nous puissions nous gouter, nous toucher,
nous sentir, nous écouter, nous voir – ensemble».
LUCE IRIGARAY
Friday, March 24, 2006
Pássaro-Poesia
Carrega-me contigo, Pássaro-Poesia
Quando cruzares o Amanhã, a luz, o impossível
Porque de barro e palha tem sido esta viagem
Que faço a sós comigo. Isenta de traçado
Ou de complicada geografia, sem nenhuma bagagem
Hei de levar apenas a vertigem e a fé:
Para teu corpo de luz, dois fardos breves.
Deixarei palavras e cantigas. E movediças
Embaçadas vias de Ilusão.
Não cantei cotidianos. Só te cantei a ti
Pássaro-Poesia
E a paisagem limite: o fosso, o extremo
A convulsão do Homem.
Carrega-me contigo.
No Amanhã.
HILDA HILST(1930-2004)
Ah quantas máscaras e submáscaras
Ah quantas máscaras e submáscaras,
Usamos nós no rosto de alma, e quando,
Por jogo apenas, ela tira a máscara,
Sabe que a última tirou enfim?
De máscaras não sabe a vera máscara,
E lá de dentro fica mascarada.
Que consciência seja que se afirme.
O aceite uso de afirmar-se a ensona.
Como criança que ante o espelho teme,
As nossas almas, crianças, distraídas,
Julgam ver outras nas caretas vistas
E um mundo inteiro na esquecida causa;
E quando um pensamento desmascara,
Desmascarar não vai desmascarado.
FERNANDO PESSOA (1888-1935)
Tradução: Jorge de Sena.
Wednesday, March 22, 2006
Começa a raiva da saudade
LXIII
Não sou daquelas que ruminam rancor:
Meu coração é o da criança.
safo
Há algo nas manhãs que não entendo agora
e a um grito de minhas pernas não atendo.
Ainda depois da noite, noite me espia
e sonho dúvidas enormes e imóveis
como a imobilidade das aranhas.
Tão pouco tempo- e tenho de deixar-me
e queria nunca ter de repartir-me.
Começa a raiva da saudade
que inventei vou ter de mim.
««««««««««««
A ÁGUA
A água
se enovela pelas pernas
em fio de vigor espiralado
sobre o ventre e o alto das coxas.
O orgasmo é quem mede forças
sem ter ímpeto contra a água.
Quisera desabar sobre ti
como chuva forte.
As coisas são boas quando destroem
e se deixam destruir.
Só assim eu venho:
eco de profundas grutas,
nada leve
uma irrealidade
estar aqui.
Só sei amar assim
- e é assim que te lavro, deserto.
OLGA SAVARY (n.1933)
Não sou daquelas que ruminam rancor:
Meu coração é o da criança.
safo
Há algo nas manhãs que não entendo agora
e a um grito de minhas pernas não atendo.
Ainda depois da noite, noite me espia
e sonho dúvidas enormes e imóveis
como a imobilidade das aranhas.
Tão pouco tempo- e tenho de deixar-me
e queria nunca ter de repartir-me.
Começa a raiva da saudade
que inventei vou ter de mim.
««««««««««««
A ÁGUA
A água
se enovela pelas pernas
em fio de vigor espiralado
sobre o ventre e o alto das coxas.
O orgasmo é quem mede forças
sem ter ímpeto contra a água.
Quisera desabar sobre ti
como chuva forte.
As coisas são boas quando destroem
e se deixam destruir.
Só assim eu venho:
eco de profundas grutas,
nada leve
uma irrealidade
estar aqui.
Só sei amar assim
- e é assim que te lavro, deserto.
OLGA SAVARY (n.1933)
Tuesday, March 21, 2006
pelo amor da Deusa Artémis
Azuis as suas vestes da cor do céu...
De mármore os seus corpos talhados
pelo amor da Deusa Artémis
Com pés ligeiros, assim dançavam noutro tempo
as raparigas de Creta à volta do altar;
frescas eram e frágeis as flores da relva que pisavam...
SAFO
De mármore os seus corpos talhados
pelo amor da Deusa Artémis
Com pés ligeiros, assim dançavam noutro tempo
as raparigas de Creta à volta do altar;
frescas eram e frágeis as flores da relva que pisavam...
SAFO
Ausencia
Habré de levantar la vasta vida
que aún ahora es tu espejo:
cada mañana habré de reconstruirla.
Desde que te alejaste,
cuántos lugares se han tornado vanos
y sin sentido, iguales
a luces en el día.
Tardes que fueron nicho de tu imagen,
músicas en que siempre me aguardabas,
palabras de aquel tiempo,
yo tendré que quebrarlas con mis manos.
¿En qué hondonada esconderé mi alma
para que no vea tu ausencia
que como un sol terrible, sin ocaso,
brilla definitiva y despiadada?
Tu ausencia me rodea
como la cuerda a la garganta,
el mar al que se hunde.
Jorge Luis Borges
que aún ahora es tu espejo:
cada mañana habré de reconstruirla.
Desde que te alejaste,
cuántos lugares se han tornado vanos
y sin sentido, iguales
a luces en el día.
Tardes que fueron nicho de tu imagen,
músicas en que siempre me aguardabas,
palabras de aquel tiempo,
yo tendré que quebrarlas con mis manos.
¿En qué hondonada esconderé mi alma
para que no vea tu ausencia
que como un sol terrible, sin ocaso,
brilla definitiva y despiadada?
Tu ausencia me rodea
como la cuerda a la garganta,
el mar al que se hunde.
Jorge Luis Borges
Thursday, March 16, 2006
Ternura, erva branca
Ternura, erva branca
Ternura, desespero, erva branca
(...)
Partir é renascer inteiramente
Extensos fogos sobre o Oceano
expostos à análise dos aventureiros
reconduzem a esperança
à interpretação dos signos
sob o céu maleável da beleza
O amor não é um símbolo
O amor não é natural
O amor não é felicidade
O amor não é sofrimento
O amor é uma arte mágica.
(...)
Ternura, desespero, erva branca
(...)
Partir é renascer inteiramente
Extensos fogos sobre o Oceano
expostos à análise dos aventureiros
reconduzem a esperança
à interpretação dos signos
sob o céu maleável da beleza
O amor não é um símbolo
O amor não é natural
O amor não é felicidade
O amor não é sofrimento
O amor é uma arte mágica.
(...)
O rosto de Ísis
Seu rosto viera da sombra
Seu rosto talhado em ônix
puro e fragrante puro e nobre puro
e máscara-indissolúvel
entrevira-O nos precipícios aonde me levara
a ambição -
e rastejei com Ele gravado no peito
todas as grandes cidades do mundo
as letras que aprendi os Sinais
os gestos que multiplicaram as plantas
ressuscitaram os corpos
e fizeram oscilar a cúpula celeste
- não eram meus. Provinham
de Seu puro e nobilíssimo rosto.
talhei com Ele a proa das galeras
desenhei-O n’areia
caminhei com Ele pregado como cravos
nas vértebras
o rosto era o deserto
e o deserto o nostálgico canto árabe
cada ruído ou forma era Ele
viera nítido das faldas do Himalaia
contornara a Índia e lançara-se no Egipto
directo ao coração da vida
era o meu próprio rosto
- e esqueci-O . Vive em mim agora
como a DEUSA; outro corpo pede
outra memória
simplesmente cada manhã é o círio
que Lhe rende preito
cada pedra Seu pedestal
e o meu espírito
Seu véu sagrado
Mário de Sá-Carneiro
Seu rosto talhado em ônix
puro e fragrante puro e nobre puro
e máscara-indissolúvel
entrevira-O nos precipícios aonde me levara
a ambição -
e rastejei com Ele gravado no peito
todas as grandes cidades do mundo
as letras que aprendi os Sinais
os gestos que multiplicaram as plantas
ressuscitaram os corpos
e fizeram oscilar a cúpula celeste
- não eram meus. Provinham
de Seu puro e nobilíssimo rosto.
talhei com Ele a proa das galeras
desenhei-O n’areia
caminhei com Ele pregado como cravos
nas vértebras
o rosto era o deserto
e o deserto o nostálgico canto árabe
cada ruído ou forma era Ele
viera nítido das faldas do Himalaia
contornara a Índia e lançara-se no Egipto
directo ao coração da vida
era o meu próprio rosto
- e esqueci-O . Vive em mim agora
como a DEUSA; outro corpo pede
outra memória
simplesmente cada manhã é o círio
que Lhe rende preito
cada pedra Seu pedestal
e o meu espírito
Seu véu sagrado
Mário de Sá-Carneiro
Wednesday, March 15, 2006
"A rosa tem de tornar a ser o botão, nascido da sua haste materna, antes que o parasita lhe tenha roído o seio e bebido a seiva da sua vida.
A árvore dourada dá flores de jóia, antes que o seu tronco esteja gasto pela tormenta.
O aluno tem de tornar ao estado de infância que perdeu
antes que o primeiro som lhe possa soar ao ouvido."
UM DIA QUE NÃO CHEGA
ando a inventar um dia
que não chega
desde o distante dia
em que nasci
tempo do não ruído
azul e violeta como os céus
numa pintura antiga
todos à escuta
de alguma coisa na linha muda do horizonte sem fim
alguma coisa que haveria de nos tocar
como a cor da terra
como sal de água espumosa e viva
na pele de alguém adormecido
um tempo
para entrançar
flores e esperança
nos membros soltos da mulher dançante
para abrigar
a luz e a sombra
na cova uterina dos princípios
um tempo
para juntar mortos e vivos
no mesmo mantra redentor
como
quando os cenários se apagam
no sentir do abraço
e tudo nos parece
desmedidamente
uma coisa só
MARIANA INVERNO
A árvore dourada dá flores de jóia, antes que o seu tronco esteja gasto pela tormenta.
O aluno tem de tornar ao estado de infância que perdeu
antes que o primeiro som lhe possa soar ao ouvido."
UM DIA QUE NÃO CHEGA
ando a inventar um dia
que não chega
desde o distante dia
em que nasci
tempo do não ruído
azul e violeta como os céus
numa pintura antiga
todos à escuta
de alguma coisa na linha muda do horizonte sem fim
alguma coisa que haveria de nos tocar
como a cor da terra
como sal de água espumosa e viva
na pele de alguém adormecido
um tempo
para entrançar
flores e esperança
nos membros soltos da mulher dançante
para abrigar
a luz e a sombra
na cova uterina dos princípios
um tempo
para juntar mortos e vivos
no mesmo mantra redentor
como
quando os cenários se apagam
no sentir do abraço
e tudo nos parece
desmedidamente
uma coisa só
MARIANA INVERNO
Tuesday, March 14, 2006
ó Lua amada
O que tens, ó Lua, que és capaz
De emocionar-me com tamanha força? Quando ainda criança
Eu costumava secar minhas lágrimas ao ver teu sorriso.
Tu te assemelhas a uma minha irmã: de mãos dadas caminhávamos
Do anoitecer à alvorada, pelo firmamento.
... e com o passar dos anos, tu ainda te mesclavas
a todos os meus desejos: tu eras os vales profundos,
Tu eras o cume das montanhas - e a pena do sábio
A harpa do poeta - a voz dos amigos - o sol;
Tu eras o rio - eras a glória conquistada;
Eras minha montaria - meu cálice pleno de vinho;
Meu feito mais extraordinário:
Tu eras o encanto das mulheres, ó Lua amada!
De emocionar-me com tamanha força? Quando ainda criança
Eu costumava secar minhas lágrimas ao ver teu sorriso.
Tu te assemelhas a uma minha irmã: de mãos dadas caminhávamos
Do anoitecer à alvorada, pelo firmamento.
... e com o passar dos anos, tu ainda te mesclavas
a todos os meus desejos: tu eras os vales profundos,
Tu eras o cume das montanhas - e a pena do sábio
A harpa do poeta - a voz dos amigos - o sol;
Tu eras o rio - eras a glória conquistada;
Eras minha montaria - meu cálice pleno de vinho;
Meu feito mais extraordinário:
Tu eras o encanto das mulheres, ó Lua amada!
as elegias a duino e sonetos a orfeu
XXL
Canta, meu coração, os jardins que não conheces;
Jardins como que vazados em vidro, claros, inacessíveis.
Água e rosas de Ispahan ou de Xiraz,
canta-os ditosos, louva-os, a nenhum comparáveis.
Mostra, meu coração, que nunca deles te privas.
Que os seus figos a amadurecerem pensam em ti.
Que convives c'os seus ares que entre os seus ramos
em flor se sublimam como em faces.
Evita o erro das privações
para a resolução acontecida: de ser!
Fio de seda, vieste entrar na teia.
A qualquer das imagens que no íntimo venhas unir-te
(seja mesmo um momento da vida da dor),
sente que o que se tem em vista é o tapete, inteiro e glorioso.
RAINER MARIA RILKE
Thursday, March 09, 2006
POESIA DO ANTIGO EGIPTO
(...)
...Sete dias e eu sem a ver.
A minha doença cresce:
tenho pesados todos os membros!
Já nem me reconheço.
O alto sacerdote não é medicina, o exorcisismo é inútil:
esta é uma doença sem explicação.
Eu disse: Ela fará com que eu viva,
o seu nome fará com que eu me erga...
As suas mensagens são a vida do meu coração
chegando e partindo.
Mas a minha amada é a melhor medicina,
mais do que qualquer mezinha ou remédio.
A minha saúde está em vê-la aparecer...
Ficarei curado mal a veja.
Abra ela os meus olhos
e os meus membros retomarão a vida;
Basta que me fale e a minha força voltará.
Abraçá-la fará desaparecer todos os vestígios da minha doença...
Há sete dias que ela me abandonou...
ESFINGE
De que sono profundo meu amor me acordas,
quando no fundo dos olhos me olhas
e me dá esta vontade louca de chorar e o teu pescoço beijar?...
Que Deusa me lembras, que ritual me recordas,
que a minha alma estremece de mal se lembrar?
Que sede é esta que percorre o meu sangue
e o meu corpo se parece volatilizar?
Que tem a tua presença , ó enigmática figura,
que me lembras a Esfingie, imponente e fria
e, contudo, de te olhar, percorre-me um frémito.
Como se Hatshepsut em pessoa visse
e tivesse instintivamente que a teus pés me ajoelhar.
Como o neófito, trémulo de respeito, à porta do Templo
nem uma palavra conseguisse balbuciar.
MEMÓRIA
Imagino-te fechada numa cidade de cristal,
num horizonte longínquo de luz
no espaço sideral, onde vives submersa.
Vejo-te de muito longe num mar distante, vindo...
Chamo-te desesperada...Não sei quem és, onde estás,
mas sei que existes e me amas tanto como eu a ti.
Talvez me chames, talvez me esperes,
talvez me queiras dar tudo o que sonhei ou pressenti.
Vejo-te porém de muito longe...
numa câmara ardente, num leito branco de cetim.
Adivinho o teu corpo suave ou translúcido
o teu sorriso doce e profundo, os teus cbelos ondolados,
as tuas mãos aladas que puxam por mim...
Pudesse eu vencer esta distância e lonjura!
Queria tanto estar a teus pés rendida
ser tua escrava e não ser mais nada.
Ah! Quem me dera se éter, volatilizar-me, subir no ar;
ser a a essência que, no espaço infinito te dá alento e forma
ser minha a tua própria vida e eu não ser nada...
in "Mulher Incesto - Sonata e Prelúdio"
De que sono profundo meu amor me acordas,
quando no fundo dos olhos me olhas
e me dá esta vontade louca de chorar e o teu pescoço beijar?...
Que Deusa me lembras, que ritual me recordas,
que a minha alma estremece de mal se lembrar?
Que sede é esta que percorre o meu sangue
e o meu corpo se parece volatilizar?
Que tem a tua presença , ó enigmática figura,
que me lembras a Esfingie, imponente e fria
e, contudo, de te olhar, percorre-me um frémito.
Como se Hatshepsut em pessoa visse
e tivesse instintivamente que a teus pés me ajoelhar.
Como o neófito, trémulo de respeito, à porta do Templo
nem uma palavra conseguisse balbuciar.
MEMÓRIA
Imagino-te fechada numa cidade de cristal,
num horizonte longínquo de luz
no espaço sideral, onde vives submersa.
Vejo-te de muito longe num mar distante, vindo...
Chamo-te desesperada...Não sei quem és, onde estás,
mas sei que existes e me amas tanto como eu a ti.
Talvez me chames, talvez me esperes,
talvez me queiras dar tudo o que sonhei ou pressenti.
Vejo-te porém de muito longe...
numa câmara ardente, num leito branco de cetim.
Adivinho o teu corpo suave ou translúcido
o teu sorriso doce e profundo, os teus cbelos ondolados,
as tuas mãos aladas que puxam por mim...
Pudesse eu vencer esta distância e lonjura!
Queria tanto estar a teus pés rendida
ser tua escrava e não ser mais nada.
Ah! Quem me dera se éter, volatilizar-me, subir no ar;
ser a a essência que, no espaço infinito te dá alento e forma
ser minha a tua própria vida e eu não ser nada...
in "Mulher Incesto - Sonata e Prelúdio"
Tuesday, March 07, 2006
SONHO ORIENTAL
Vinde agora amadas Graças
e Musas de belas cabeleiras! Safo
Sonho-me às vezes rei, nalguma ilha,
Muito longe, nos mares do Oriente,
onde a noite é balsâmica e fulgente
E a lua cheia sobre as águas brilha...
O aroma da magnólia e da baunilha
Paira no ar diáfano e dormente...
Lambe a orla dos bosques, vagamente,
O mar com finas ondas de escumilha...
E enquanto eu na varanda de marfim
Me encosto, absorto num cismar sem fim,
Tu meu amor, divagas ao luar,
Do profundo jardim pelas clareiras,
Ou descanças debaixo palmeiras,
Tendo aos pés um leão familiar.
Antero de Quintal - "Sonetos Selectos"
e Musas de belas cabeleiras! Safo
Sonho-me às vezes rei, nalguma ilha,
Muito longe, nos mares do Oriente,
onde a noite é balsâmica e fulgente
E a lua cheia sobre as águas brilha...
O aroma da magnólia e da baunilha
Paira no ar diáfano e dormente...
Lambe a orla dos bosques, vagamente,
O mar com finas ondas de escumilha...
E enquanto eu na varanda de marfim
Me encosto, absorto num cismar sem fim,
Tu meu amor, divagas ao luar,
Do profundo jardim pelas clareiras,
Ou descanças debaixo palmeiras,
Tendo aos pés um leão familiar.
Antero de Quintal - "Sonetos Selectos"
BAILARINA
XVIII
Bailarina: ó transposição
em marcha de todo o transitório: como tu a ofertavas!
E o turbilhão no fim, esta árvore de movimento,
não tomava ele posse plena do ano conquistado?
Não floria, para que o teu vibrar de há pouco como enxame o envolvesse,
de repente o seu cume de silêncio? E sobre ele,
não era sol, não era verão, o calor,
este calor inúmero que de ti saia?
Mas também dava fruto, sim, a árvore do êxtase.
Não são seus frutos tranquilos: o jarro,
listrado de maturidade, e o vaso ainda mais maduro?
E nos retratos: não ficou o desenho
que o traço escuro das tuas sobrancelhas
inscreveu na parede do próprio girar?
Raine Maria Rilke
Bailarina: ó transposição
em marcha de todo o transitório: como tu a ofertavas!
E o turbilhão no fim, esta árvore de movimento,
não tomava ele posse plena do ano conquistado?
Não floria, para que o teu vibrar de há pouco como enxame o envolvesse,
de repente o seu cume de silêncio? E sobre ele,
não era sol, não era verão, o calor,
este calor inúmero que de ti saia?
Mas também dava fruto, sim, a árvore do êxtase.
Não são seus frutos tranquilos: o jarro,
listrado de maturidade, e o vaso ainda mais maduro?
E nos retratos: não ficou o desenho
que o traço escuro das tuas sobrancelhas
inscreveu na parede do próprio girar?
Raine Maria Rilke
Friday, March 03, 2006
SAUDADE
De quem é esta saudade
que meus silêncios invade,
que de tão longe me vem?
De quem é esta saudade,
de quem?
Aquelas mãos só carícias,
Aqueles olhos de apelo,
aqueles lábios-desejo...
E estes dedos engelhados,
e este olhar de vã procura,
e esta boca sem um beijo...
De quem é esta saudade
que sinto quando me vejo?
GILKA MACHADO
(in Velha poesia, 1965)
CORPO DE AROMA
Se foste corola ou barco,
mas quando?
minha irmã,
minha leve amante, minha árvore,
que o mundo levantava
na inocência absoluta
do instante.
Alta estavas no amplo e recolhida
como uma lâmpada,
alta estavas na varanda branca.
Se acaso ainda podes ser aroma
dos meus olhos,
corpo no corpo,
retiro e substância, linha alta
da delícia,
nada te pedirei na minha ânsia
de puro espaço,
de azul imediato,
de luz para o olvido e o deserto.
ANTÓNIO RAMOS ROSA(n. 1924)
mas quando?
minha irmã,
minha leve amante, minha árvore,
que o mundo levantava
na inocência absoluta
do instante.
Alta estavas no amplo e recolhida
como uma lâmpada,
alta estavas na varanda branca.
Se acaso ainda podes ser aroma
dos meus olhos,
corpo no corpo,
retiro e substância, linha alta
da delícia,
nada te pedirei na minha ânsia
de puro espaço,
de azul imediato,
de luz para o olvido e o deserto.
ANTÓNIO RAMOS ROSA(n. 1924)
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